domingo, 8 de março de 2020

As aves não têm céu | Ricardo Fonseca Mota


As aves não têm céu conta-nos a história de um pai que perde uma filha num acidente e luta desesperadamente para a manter viva na sua memória.
"Agarra-se desesperadamente à memória com a mesma força com que luta para se esquecer do que aconteceu. Como pode deixar a filha morrer novamente, agora dentro de si? Não pode. Leto morre de medo de a esquecer. Por isso não consegue adormecer. Tem medo de não se lembrar da voz dela quando acordar. Tem medo de sonhar com ela deitada no caixão branco. Tem medo."
Achei a personagem do Leto bem construída, como que se ele deixasse de existir como pessoa, não havendo descrições profundas de quem ele é exatamente, existindo apenas e só sofrimento. É tanto o sofrimento descrito que inunda tudo o que nos vai sendo contado sobre a vida de Leto antes e após o acidente.

A escrita é completamente diferente de tudo o que já li, com um misto de uma narração do que está a acontecer, ou aconteceu, com frases pelo meio do que a personagem ou o narrador estão a pensar. Como quando estamos a formular um discurso na nossa cabeça e aparecem uns pensamentos aleatórios que não pertencem à sequência do que estamos a pensar naquele momento, mas que mostram o que verdadeiramente se está a passar no nosso inconsciente naquele momento.

E o que se atravessa no raciocínio do Leto são as últimas palavras da sua filha "-Pai! -Pai!"

Mas não só da história de Leto se compõem este livro. Também conhecemos as histórias da Outra, do Cid, de Raúl e de um taxista que é Eduardo que é Falcão, ou Falcão que é Eduardo. E com todas estas outras personagens percebemos que nunca vamos saber o que realmente se passa na vida das pessoas com quem convivemos.

"A memória é uma ficção como outra qualquer."

Apesar de ter sido uma boa leitura, senti que com este livro ficou a faltar algo. Apesar de a escrita ser original, de ter gostado da história, de ter imensas citações incríveis e coisas com que me relaciono (não perdi um filho humano, mas perdi um filho gato), penso que por a história andar sempre num para arranca entre personagens e aos círculos (e sim, eu sei que é assim quando estamos de luto) não consegui gostar tanto dela como esperava. Senti que faltou qualquer coisa a este livro que o fizesse ser excecional. Mas também pode ser a iludida humana em mim a querer um final feliz, uma luz ao fundo deste túnel que é o luto... e talvez não haja...

Classificação: ★★★★☆ (4/5)

Este livro foi-me recomendado pela Míriam do blog Míriam The Mermaid e li-o para o desafio #newyearwithbooks2019 .

Compra o livro: Wook | Bertrand

Aviso Legal: Este livro foi-me enviado pela editora em troca de uma opinião honesta. Todas as opiniões expressas nesta resenha são verdadeiras e completamente minhas.

Com amor, Brenda

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